ARTIGO PSJ
Aquisição de Imóveis no Brasil por Estrangeiros
1. Introdução | 2. Imóveis Urbanos | 3. Imóveis Rurais | 4. Conclusão
1. Introdução
Segundo o art. 12 da Constituição da República Federativa doBrasil de 1988, estrangeiro é aquele que não possui nacionalidade brasileira (nato ou naturalizado).
Quando se trata de aquisição de imóveis urbanos do território brasileiro, a nossa legislação não estabelece impedimentos para que os estrangeiros os adquiram. Entretanto, foram estabelecidas restrições legais para a aquisição dos imóveis rurais, com a finalidade de proteger a soberania brasileira. De toda forma, os estrangeiros precisam observar os requisitos legais para estarem aptos a registrar a propriedade sob sua titularidade.
Como primeiro passo a se observar, para estar apto a adquirir um imóvel no Brasil, o estrangeiro precisa atentar à regularidade documental. Se pessoa física, precisa realizar sua inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), da Secretaria da Receita Federal, conforme INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 2172, de 09 de janeiro de 2024. Sendo pessoa jurídica, de igual forma, para aquisição de Imóveis, também precisa realizar a inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), conforme as orientações da Receita Federal do Brasil.
Neste ponto, é importante ressaltar que, para fins de aquisição de imóveis no Brasil, a pessoa jurídica brasileira da qual participem, a qualquer título, pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas, que tenham a maioria do seu capital social e que residam ou tenham sede no Exterior, serão equiparadas a pessoas jurídicas estrangeiras, nos termos do Art. 1º, § 1º da Lei 5.709/71.
2. Imóveis Urbanos
Para a aquisição de Imóveis urbanos, a legislação brasileira não dispõe de nenhuma restrição significativa, independentemente da destinação do imóvel, seja para residência ou investimento, bem como não há distinção se o estrangeiro reside ou não no Brasil ou, se pessoa jurídica, pretende ou não operar no país.
Para ser formalizada a aquisição, devem ser cumpridos os trâmites normais para a aquisição de Imóveis, quais sejam: pagar o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, lavrar a Escritura Pública correspondente e fazer o devido registro no Cartório de Imóveis competente.
Para tanto, como já referido, o estrangeiro, seja pessoa física ou jurídica, deve estar com sua documentação regular, devidamente cadastrado perante a Receita Federal do Brasil. Caso necessário, o estrangeiro poderá ser representado por procurador.
Quanto às restrições legais, estas são apenas em relação a imóveis da União, nos termos do art. 205 do Decreto-Lei nº 9.760/1946. A esta regra, porém, ainda temos as seguintes exceções:
a) Se houver expressa autorização Presidente da República (caput);
b) Quando se tratar de unidade autônoma de condomínios, regulados pela Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, desde que o imóvel esteja situado em zona urbana, e as frações ideais pretendidas, em seu conjunto, não ultrapassem 1/3 (um terço) de sua área total(§1º);
c) Quando se tratar de transferência de titularidade de terrenos de até mil metros quadrados, situados dentro da faixa de cem metros ao longo da costa marítima, desde que adquirido por pessoa física (§3º).
3. Imóveis Rurais
Em relação aos imóveis rurais, o ordenamento jurídico brasileiro previu diversas restrições. Isso se dá com o intuito do Estado garantir sua soberania nacional e evitar a destinação inadequada das terras nacionais, sem o devido retorno socioeconômico para o país.
A Constituição Federal previu, em seu art. 190, a necessidade de regulamentação e limitação da aquisição ou arrendamento de imóveis rurais por pessoa física ou jurídica estrangeira. Regulamentando tais regras, temos, primordialmente: a Lei nº 5.709/1971 e o Decreto nº 74.965/1974 que a regulamenta; a Lei nº 6.634/1979, que dispõe sobre a Faixa de Fronteira e o Decreto nº 85.064/1980 que a regulamenta; além da Instrução Normativa INCRA nº 88/2017.
A primeira restrição trazida pela Lei nº 5.709/1971 é que, a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros só poderá se dar se este estrangeiro for residente no país, quando pessoa física, ou, quando pessoa jurídica, se autorizada a funcionar no Brasil.
A Lei não estabelece se a residência deve ser permanente ou se poderia ser considerada a residência temporária. Para tanto, atribui-se a definição de domicílio constante no art. 70 do Código Civil Brasileiro (Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo).
É importante verificar ainda que, conforme a Resolução Normativa nº 36/2018 do Conselho Nacional de Imigração, alterada pela Resolução CNIG MJSP nº 46/2021, está prevista a concessão de autorização de residência a estrangeiros em decorrência de investimento imobiliário, condicionado à aquisição de bens imóveis localizados em área urbana, em montante igual ou superior a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), podendo ser imóveis construídos ou em construção. Esse valor reduz-se em 30% (trinta por cento) se os bens imóveis estiverem localizados nas regiões Norte e Nordeste do País.
Excetuam-se às restrições da Lei nº 5.709/1971 a aquisição de imóveis por estrangeiros, ainda que não residentes no país ou não autorizados a funcionar no país nas seguintes hipóteses:
a) Aquisição de imóvel rural através de herança atribuída a herdeiro legítimo. Entretanto, caso este imóvel esteja localizado em faixa de fronteira, ainda assim, será necessária a autorização do Conselho Nacional de Defesa para a concretização da aquisição da titularidade do imóvel (inciso I, do § 2º do Art. 1º);
b) Hipóteses de aquisição de imóveis rurais em decorrência da constituição de garantia real, inclusive a transmissão da propriedade fiduciária em favor de pessoa jurídica, nacional ou estrangeira (inciso II, do § 2º do Art. 1º);
c) Recebimento de imóvel em liquidação de transação com pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, ou pessoa jurídica nacional da qual participem, a qualquer título, pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas que tenham a maioria do seu capital social e que residam ou tenham sede no exterior, por meio de realização de garantia real, de dação em pagamento ou de qualquer outra forma.
Após verificar qual estrangeiro pode realizar a aquisição de imóvel rural, passamos a verificar as restrições legais para quais imóveis rurais podem ser objeto de aquisição, conforme a leitura dos arts. 3º, 5º e 7º da Lei nº 5.709/1971. Logo, podem ser adquiridos imóveis rurais, considerando os parâmetros definidos na Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra), que define o módulo rural:
a) Por pessoa física estrangeira, desde que não exceda a 50 (cinquenta) módulos de exploração indefinida, em área contínua ou descontínua, observando que:
(i) a aquisição de área não superior a 3 (três) Módulos de Exploração Indefinida - MEI, a aquisição será livre, independendo de qualquer autorização ou licença. Entretanto, será necessária tal autorização a partir da segunda aquisição ou arrendamento, mesmo que o somatório das áreas dos imóveis não ultrapasse 3 (três) MEI, observados ainda, os limites percentuais do município de localização do imóvel pretendido;
(ii) a aquisição de área compreendida entre 3 (três) e 50 (cinquenta) módulos de exploração indefinida depende sempre de autorização do INCRA. Ainda, para áreas superiores a 20 (vinte) MEI deverá serapresentado também um projeto de exploração do imóvel;
(iii) a aquisição de área superior a 50 (cinquenta) módulos de exploração indefinida depende de autorização do Presidente da República.
(iv) Quando o somatório de área de propriedade ou arrendamento por pessoa natural, exceder 50 (cinquenta) MEI em área contínua ou descontínua do território nacional, será necessária a autorização do Congresso Nacional (§ 2º do art. 23 da Lei nº 8.629/1993), por meio de processo administrativo formalizado junto ao Incra, na Superintendência Regional de localização do imóvel rural.
b) Por pessoa jurídica estrangeira, conforme a definição legal, a aquisição de imóveis rurais dependerá necessariamente de autorização do Incra para qualquer extensão de área, bem como apresentação de projeto de exploração, destinando as áreas para implantação de projetos agrícolas, pecuários, industriais, ou de colonização, vinculados aos seus objetivos estatutários. Tais projetos deverão ser aprovados pelo Ministério da Agricultura, ouvido o órgão federal competente de desenvolvimento regional na respectiva área. Sendo o projeto de caráter industrial, será ouvido o Ministério da Indústria e Comércio. Quando o somatório de áreas do requerente exceder 100 (cem) MEI, em área contínua ou descontínua, no território nacional, a aquisição ou o arrendamento somente será possível com a autorização do Congresso Nacional.
c) A aquisição de imóvel localizado em área considerada indispensável à segurança nacional, seja a aquisição por pessoa estrangeira física ou jurídica, dependerá do assentimento prévio da Secretaria-Geral do Conselho de Segurança Nacional.
Existem, ainda, as restrições para área dos Municípios, por pessoa física ou jurídica estrangeira (art. 12 da Lei nº 5.709/1971), quais sejam:
a) O quantitativo de área de propriedade da pessoa estrangeira, física ou jurídica, não poderá ultrapassar a 25% (vinte e cinco por cento) da área total do Município;
b) Os estrangeiros de mesma nacionalidade só poderão adquirir ou arrendar o equivalente a 10% (dez por cento) da área total do Município;
c) Na aquisição ou no arrendamento de imóvel rural em condomínio computar-se-ão os percentuais de áreas previstos nos itens supracitados, calculados com base na área total do imóvel rural, por estrangeiros, e, por nacionalidade de cada condômino estrangeiro; e
d) As exigências acima não se aplicam ao requerente estrangeiro que tiver filho brasileiro ou que for casado com brasileiro(a) sob o regime de comunhão de bens, ou que viver em união estável com brasileiro(a), bem como, em caso dele ter adquirido alguma área rural em virtude de sucessão legítima.
A Lei nº 5.709/1971 reforça a obrigatoriedade da formalização da aquisição dos imóveis por escritura pública, com o competente registro no Cartório de Registro de Imóveis, além disso, determina que os cartórios realizem um cadastro especial, em livro auxiliar, dessas aquisições. Trimestralmente, esses livros auxiliares devem ser remetidos à Corregedoria da Justiça dos Estados a que estiverem subordinados e ao Ministério da Agricultura, a relação das aquisições de áreas rurais por pessoas estrangeiras.
Existe, ainda a possibilidade de aquisição de imóvel por estrangeiro a título de usucapião. Aplicam-se todas as regras para a aquisição trazidas pela legislação, além da exigência de se prosseguir com o devido processo para a formalização de aquisição, além da solicitação do cadastro do imóvel rural no Sistema Nacional de Cadastro Rural – SNCR, com o resultado da decisão judicial ou administrativa.
4. Conclusão
As regras para a aquisição de imóveis por estrangeiros, sejam pessoas físicas ou jurídicas (incluindo as pessoas jurídicas brasileiras equiparadas a estrangeiras) possuem diversos requisitos e restrições legais que devem ser detalhadamente observados, inclusive pelo fato de que existem legislações esparsas que tratam sobre o tema.
Apesar das legislações serem antigas, ainda estão vigentes e devidamente regulamentadas pelos órgãos que as executam. Inclusive, em decisão recente, o TRF, em sede do Processo nº 5019146-84.2023.4.04.0000, proferiu decisão ratificando a observância dos requisitos legais para a aquisição de imóveis por pessoas estrangeiras.
O principal motivo de tais restrições é a defesa da soberania nacional e o gerenciamento do território brasileiro, objetivando a segurança do país, controlando a intervenção estrangeira e impondo limites à exploração do território nacional por outras nações.
Bibliografia
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