ARTIGO PSJ

Aprovação Anual de Contas nas Sociedades: Importância e Procedimento

Portela Soluções Jurídicas

Escritório de Advocacia

1. Introdução | 2. Importância da Realização | 3. Aprovação de Contas nas Sociedades Limitadas | 4. Aprovação de Contas nas Sociedades Anônimas | 5. Conclusão

1. Introdução

As obrigações de uma empresa vão muito além daquelas atreladas à produção e à consecução de resultados financeiros. A existência de uma governança corporativa e de transparência no ambiente empresarial são valores fundamentais que sustentam uma estrutura sólida e duradoura. Nesse contexto, a realização da aprovação anual de contas se destaca como um dos pilares para organização, transparência e credibilidade das sociedades.

A aprovação de contas é obrigação legal prevista no artigo 1.078 do Código Civil para as Sociedades Limitadas e, no artigo 132 da Lei nº 6.404/1976, para as Sociedades Anônimas. Deve ser realizada dentro dos 4 (quatro) meses subsequentes ao término do exercício social e é o momento no qual os administradores apresentam as contas aos sócios para discussão e aprovação.

Nesse momento, são apresentados relatórios financeiros, balanços patrimoniais e demonstrativos de resultados do exercício (artigo 132, I, II e IV da Lei nº 6.404/76 e artigo 1.078, I da Lei nº 10.406/2002). Esse conjunto de informações permite que os acionistas ou sócios tenham uma visão completa da saúde financeira e operacional da empresa, avaliando sua performance e tomando decisões informadas. Além disso, a transparência se manifesta na possibilidade de questionamento e esclarecimento de dúvidas durante a assembleia. Os acionistas ou sócios têm a oportunidade de obter respostas diretas e transparentes da administração, fortalecendo a confiança nos rumos da empresa.

Sendo assim, é evento crucial nas Sociedades.

2. Importância da Realização

Nessa toada, destaca-se que, apesar de, na prática, muitas sociedades, em especial as limitadas, negligenciarem a aprovação de contas, tal obrigação é de extrema importância, pois representa a existência de uma governança corporativa estruturada na empesa e o seu compromisso com a ética e as boas práticas do mercado.

Tal compromisso, por sua vez, influencia em diversos aspectos, a saber:


  1. Caso a sociedade venha a participar ou participe de processos licitatórios ou outras operações com agentes públicos e/ou parcerias público privadas, por via de regra serão exigidos os documentos que comprovem a prestação de contas;

  2. Muitas vezes é requisito obrigatório para a obtenção de crédito perante bancos;

  3. A ausência de prestação de contas pode inviabilizar ou retardar a celebração de negócios com grandes players do mercado;

  4. Evita conflitos internos entre os sócios minoritários, sócios majoritários e administradores, afastando questionamentos, inclusive, sobre a distribuição de lucros apurados pela sociedade;

  5. Exime os administradores de quaisquer responsabilidades trazidas pelo artigo 1.016 do CC perante a pessoa jurídica, sendo esse, inclusive, o entendimento firmado pelo STJ no REsp 1313725 SP 2011/0286947-4:


“RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. SOCIEDADE ANÔNIMA. RESPONSABILIZAÇÃO DO DIRETOR FINANCEIRO. A APROVAÇÃO DAS CONTAS POR ASSEMBLEIA GERAL SEM RESSALVAS. PRÉVIA ANULAÇÃO. PRECEDENTES. SÚMULA Nº 211/STJ.HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2. Esta Corte Superior mantém o entendimento de que, salvo se anulada, a aprovação das contas sem reservas pela assembleia geral exonera os administradores e diretores de quaisquer responsabilidades. 3. A matéria versada nos demais artigos apontados como violados no recurso especial não foi objeto de debate pelas instâncias ordinárias, sequer de modo implícito, motivo pelo qual, ausente o requisito do prequestionamento, incide o disposto na Súmula nº 211/STJ. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de não ser possível a revisão do quantitativo em que autor e ré decaíram do pedido para fins de aferir a sucumbência recíproca ou mínima, por implicar reexame de matéria fático-probatória, vedado pela Súmula nº 7/STJ. 5. Recurso especial não provido. (grifo nosso) (STJ - REsp: 1313725 SP 2011/0286947-4, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 26/06/2012, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/06/2012)

Ou seja, a sociedade que aprova anualmente suas contas, mais do que cumprir uma obrigação legal e evitar questionamentos futuros, mostra-se transparente na condução geral dos negócios e aderente às melhores práticas do mercado, o que pode ser um fator decisivo em eventual operação financeira, licitação, concorrência privada e recebimento de investimento, por exemplo, sendo vista como um diferencial.

Ademais, é relevante observar que as sociedades anônimas de capital aberto estão sujeitas a sanções mais rigorosas do que as sociedades de capital fechado. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem um poder de fiscalização expressivo, e empresas que violam as normas da Lei de sociedades por ações estão sujeitas a advertências, multas, suspensão do cargo de diretores infratores e outras penalidades estabelecidas na legislação.

3. Aprovação de Contas nas Sociedades Limitadas

Nas sociedades limitadas, a prestação de contas é realizada por meio de Reunião de Sócios, quando a sociedade possuir até 10 (dez) sócios, e por meio de Assembleia quando o número de sócios for superior a 10 (dez), devendo a convocação observar o disposto no Contrato Social. Em caso de omissão do mesmo, segue-se a regra do artigo 1.152, § 3º do Código Civil:

Artigo 1.152, § 3º: O anúncio de convocação da assembleia de sócios será publicado por três vezes, ao menos, devendo mediar, entre a data da primeira inserção e a da realização da assembleia, o prazo mínimo de oito dias, para a primeira convocação, e de cinco dias, para as posteriores. (grifo nosso)

Outrossim, a regra legal, disposta no artigo 1.078 do Código Civil, determina que o balanço patrimonial e as demonstrações do resultado econômico devem ser disponibilizados aos sócios não administradores até 30 (trinta) dias antes da realização da reunião anual.

Para deliberações na Assembleia, deverá ser realizada a leitura do balanço patrimonial e das demonstrações financeiras, os quais serão submetidos, pelo presidente, à discussão e votação, nestas não poderão tomar parte os membros da administração e, se houver, os do Conselho Fiscal. A forma de votação deverá ser especificada em ata, a qual deverá ser registrada perante a Junta Comercial competente, para que surta seus efeitos legais.

Merece destaque, ainda, que, em relação a publicações, o Código Civil não prevê a necessidade de as Sociedades Limitadas publicarem suas demonstrações financeiras. Apesar do antigo entendimento firmado pela JUCESP na Deliberação 2/15, de que as sociedades limitadas de grande porte (ativo total superior a R$ 240.000.000,00 ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 no exercício anterior) deveriam obrigatoriamente publicar suas demonstrações financeiras na mesma forma das sociedades anônimas, o Departamento de Registro Empresarial e Integração (DREI) firmou orientação, por meio do Ofício Circular SEI nº 4742/2022/ME, que é facultativa às sociedades limitadas de grande porte a publicação das demonstrações financeiras, inexistindo qualquer tipo de obrigação. Tal entendimento foi fixado pelo STJ no julgamento do REsp 1.824.891, em 21 de março de 2023, o qual decidiu pela ilegalidade da exigência de publicações para limitadas de grande porte.

Sendo assim, a aprovação de contas nas limitadas está, atualmente, simplificada e desburocratizada, uma vez que os sócios e administradores não precisam mais se preocupar com as formalidades e custos das publicações.

4. Aprovação de Contas nas Sociedades Anônimas

Já nas Sociedades Anônimas, a aprovação de contas do exercício social ocorre por meio de Assembleia Geral Ordinária (AGO) dos acionistas, nos termos do artigo 132 da Lei das SA, a qual será convocada mediante anúncio publicado por 3 (três) vezes no mínimo, com oito dias de antecedência para a primeira convocação, e 5 (cinco) dias de antecedência para a segunda convocação, nas companhias fechadas.

Aqui, os administradores devem comunicar, em até 1 (um) mês antes da data marcada para a realização da AGO, por anúncios publicados por 3 (três) vezes, no mínimo, que se acham à disposição dos acionistas as demonstrações financeiras na sede social, nos termos da o artigo 133 da Lei das S.A., e publicá-las com pelo menos 5 (cinco) dias de antecedência da realização da AGO, conforme § 3º do mesmo dispositivo legal.

Ainda, os §§ 4º e 5º do citado artigo contemplam duas hipóteses em que as publicações nos prazos acima referidos serão dispensadas, quais sejam: (I) quando a assembleia geral ordinária reunir a totalidade dos acionistas(art.133, § 4º); ou (II) quando a companhia publicar o balanço e demonstrações financeiras até 1 (um) mês antes da data marcada para a realização da assembleia geral ordinária (art.133, § 5º). Nesses casos, as publicações do balanço e dos demonstrativos financeiros devem ser realizadas em qualquer momento antes da Assembleia.

Acerca das publicações, seguindo a tendência da desburocratização, com as recentes mudanças na Lei nº 6.404/76, trazidas pela Lei nº 13.818/2019 (em vigor a partir de 01/01/2022), as Sociedades por Ações ficam dispensadas da publicação de seus atos, inclusive as demonstrações financeiras no Diário Oficial. É necessária apenas a publicação dos atos em jornal de grande circulação, de forma resumida, e com a divulgação da íntegra do ato na página do mesmo jornal na internet.

A Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) também foi alterada pela Lei Complementar nº 182/2021 (Marco Legal das Startups) que permite que as companhias fechadas com receita bruta anual de até R$ 78 milhões realizem as suas publicações apenas no formato eletrônico, facilitando com isso o procedimento da aprovação de contas. Nessa toada, ressalta-se que, paras as convocações realizadas eletronicamente, poderão ser publicadas uma única vez, nos prazos supramencionados.

Em síntese:


  1. Anúncios devem ser publicados por 3 (três) vezes, com 1 (um) mês de antecedência da AGO, informando que os demonstrativos contábeis se encontram à disposição dos acionistas na sede social;

  2. Convocação da AGO deve ocorrer por publicação do edital por, no mínimo, 3 (três) vezes, com 8 (oito) dias de antecedência para a primeira convocação e com 5 (cinco) dias de antecedência para a segunda convocação. Quando realizada eletronicamente, basta uma única publicação;

  3. Balanço e Demonstrativos Contábeis devem ser publicados com até 5 (cinco) dias de antecedência da realização da AGO;

  4. Em caso de presença da totalidade dos acionistas, fica dispensada convocação e as publicações no prazo legal, podendo estas ocorrerem até o momento da Assembleia; e

  5. Para companhias com receita bruta anual de até R$ 78 milhões, fica permitida a publicação eletrônica por meio da Central de Balanços SPED.


Desta feita, cumpridas as exigências legais, será realizada AGO, procedendo-se com a apresentação, deliberação e aprovação das contas e dos demonstrativos contábeis da Companhia. Por fim, arquiva-se a Ata de Assembleia na Junta Comercial competente para que a mesma surta seus efeitos legais.

5. Conclusão

A realização da prestação anual de contas vai muito além de um simples cumprimento de obrigações legais; ela representa um momento ímpar para construir e fortalecer a credibilidade de uma empresa perante seus investidores, acionistas e stakeholders. A transparência proporcionada pela AGO, com a apresentação detalhada de relatórios financeiros e operacionais, permite aos acionistas e aos sócios tomar decisões informadas e avaliar o desempenho da empresa de forma clara.

Para tanto, ressalta-se a importância de uma governança corporativa sólida nas empresas. A Assembleia é um evento essencial de prestação de contas e transparência, enquanto a governança corporativa fornece a estrutura e os princípios que garantem que essa prestação de contas seja realizada de maneira eficiente e ética. Com uma governança bem estruturada, os procedimentos para convocação, realização e divulgação da AGO são claramente definidos, garantindo que os interesses de todos os sócios sejam adequadamente representados.

Em suma, a empresa que realiza a aprovação de contas regularmente, seguindo as normas e regulamentos estabelecidos, demonstra seu compromisso com as boas práticas de governança corporativa, reforçando a imagem de uma organização ética e confiável. Isso resulta em uma maior confiança dos investidores, o que pode atrair novos acionistas e sócios interessados em participar de um negócio seguro e bem gerido.

Ressalta-se que a credibilidade é um ativo intangível, mas de valor inestimável. Empresas que demonstram credibilidade em suas ações e decisões são vistas com respeito pelo mercado e pelos investidores. A aprovação anual de contas é uma poderosa ferramenta para conquistar e manter essa credibilidade perante os stakeholders.

Portanto, a AGO não deve ser vista apenas como uma obrigação legal, tanto nas Sociedades Anônimas quanto nas Sociedades Limitadas, haja vista ser uma oportunidade valiosa para fortalecer a credibilidade da empresa. Ademais, conforme elucidado no presente artigo, a legislação atual confere uma sistemática desburocratizada e econômica para a realização das Assembleias atualmente, não havendo razões para negligenciar uma prática tão importante.

Empresas com estrutura de governança organizada, transparente e ética, possuem destaque no mercado e uma reputação mais sólida e duradoura que as demais.

Referências Bibliográficas:

- BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, 11 de janeiro de 2002. Disponível em:<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm >

- BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, 17 de dezembro de 1976. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm>.

- CARUSO, Bruno. BISSON, Regina Célia Baraldi. LEITE, Fernanda Pereira. A importância da aprovação anual de contas para sociedades empresárias e entidades sem fins lucrativos. Disponível em: < https://www.migalhas.com.br/>

- Superior Tribunal de Justiça (STJ). Recurso Especial nº 1313725. Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA. Julgado em 26 de junho de 2012. Publicado no Diário da Justiça Eletrônico em 29 de junho de 2012.