ARTIGO PSJ

Busca e Apreensão Extrajudicial de Bens Móveis Alienados Fiduciariamente – Nova Possibilidade prevista na Lei 14.711 de 2023(Marco Legal das Garantias)

Portela Soluções Jurídicas

Escritório de Advocacia

1. Introdução | 2. Conceito e Previsão legal | 3. Do Procedimento de Busca e Apreensão Extrajudicial | 4. Conclusão.

1. INTRODUÇÂO

Na última quinta-feira, 14 de dezembro de 2023, o Congresso Nacional rejeitou o veto presidencial parcial aposto da Lei 14.711, de 2023, o chamado Marco Legal das Garantias. Entre outros dispositivos, voltou a ser possível a realização do procedimento de busca e apreensão extrajudicial de bens móveis em caso de inadimplemento de contrato com cláusula de alienação fiduciária [1].

Ao justificar o veto dos dispositivos, agora reintegrados ao texto da Lei 14.711 pelo Congresso, o Executivo argumentou que a proposta apresentava um vício de inconstitucionalidade [2]. Isso se deve ao fato de que tais dispositivos, ao estabelecerem uma modalidade extrajudicial de busca e apreensão de bens móveis alienados fiduciariamente como garantia, poderia permitir a execução dessa medida coercitiva pelos tabelionatos de registro de títulos e documentos sem a necessidade de uma ordem judicial.

Antes da aprovação da referida lei, para enfrentar à inadimplência do devedor nos contratos com a cláusula de alienação fiduciária, a única opção facultada ao credor era iniciar uma ação judicial de busca e apreensão para tentar recuperar o crédito.

No entanto, a sobrecarga de processos no sistema judiciário e a demora na resolução de casos, demonstrou ser flagrante a necessidade de criação de meios alternativos de resolução de conflitos para assegurar os direitos.

2. CONCEITO

Os contratos que envolvem a cláusula de alienação fiduciária dizem respeito à circunstância em que o credor concede uma quantia em dinheiro ao devedor para a aquisição de um bem móvel. Esse bem atua como garantia até que a obrigação seja totalmente cumprida, momento em que ocorre a transferência de propriedade para o devedor, juntamente com a liberação de quaisquer restrições associadas ao bem.

O Código Civil[3], prevê especificamente nos artigos 1361 e seguintes que a propriedade fiduciária é caracterizada pela transferência do domínio do bem móvel ao credo, chamado de credor fiduciário, que se trata de via de regra, de uma instituição bancária ou financeira, que fornece o dinheiro para a transação.

O devedor fiduciante tem a posso direta do bem, sendo que o domínio e a posse indireta pertencem ao credor fiduciário, á titulo de garantia, não se operando a tradição real.

Quando vencida a divida e não paga, fica o credor obrigado a vender judicialmente ou extrajudicialmente, a coisa a terceiro, a aplicar o preço no pagamento de seu credito e das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor.

Na hipótese da venda da coisa, caso o produto obtido não baste para o pagamento da dívida e as despesas de cobrança, continuará o devedor obrigado ao pagamento do saldo remanescente.

3. DO PROCEDIMENTO DE BUSCA E APREENSÃO EXTRAJUDICIAL.

Com a derrubada do veto presidencial, voltam valer os comandos previstos nos parágrafos “§ 1º ao 11º do artigo 8º-C acrescidos pela LEI 14.711, de 2023 ao Decreto-Lei nº 911, de 1º de outubro de 1969[4], como a seguir reproduzido:

“Art. 8º-C Consolidada a propriedade, o credor poderá vender o bem na forma do art. 2º deste Decreto-Lei.

§ 1º Caso o bem não tenha sido entregue ou disponibilizado voluntariamente no prazo legal, o credor poderá requerer ao oficial de registro de títulos e documentos a busca e apreensão extrajudicial, com apresentação do valor atualizado da dívida e da planilha prevista no inciso III do § 13 do art. 8º-B deste Decreto-Lei.”

§ 2º Recebido o requerimento, como forma de viabilizar a busca e apreensão extrajudicial, o oficial adotará as seguintes providências:

I - lançará, no caso de veículos, restrição de circulação e de transferência do bem no sistema de que trata o § 9º do art. 3º deste Decreto-Lei;

II - comunicará, se for o caso, aos órgãos registrais competentes para averbação da indisponibilidade do bem e da busca e apreensão extrajudicial;

III - lançará a busca e apreensão extrajudicial na plataforma eletrônica mantida pelos cartórios de registro de títulos e documentos por meio de suas entidades representativas, com base no art. 37 da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009; e

IV - expedirá certidão de busca e apreensão extrajudicial do bem.

§ 3º Para facilitar a realização das providências de que tratam os incisos I e II do § 2º deste artigo, os órgãos de trânsito e outros órgãos de registro poderão manter convênios com os cartórios de registro de títulos e documentos, ainda que por meio das suas entidades representativas incumbidas de promover o sistema de registro eletrônico de que trata o art. 37 da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009.

§ 4º O credor, por si ou por terceiros mandatários, poderá realizar diligências para a localização dos bens.

§ 5º Os terceiros mandatários de que trata o § 4º deste artigo poderão ser empresas especializadas na localização de bens.

§ 6º Ato do Poder Executivo poderá definir requisitos mínimos para o funcionamento de empresas especializadas na localização de bens constituídas para os fins deste Decreto-Lei.

§ 7º Apreendido o bem pelo oficial da serventia extrajudicial, o credor poderá promover a venda de que trata o caput deste artigo e deverá comunicá-la ao oficial de cartório de registro de títulos e documentos, o qual adotará as seguintes providências:

I - cancelará os lançamentos e as comunicações de que trata o § 2º deste artigo;

II - averbará no registro pertinente ou, no caso de bens cuja alienação fiduciária tenha sido registrada apenas em outro órgão, comunicará a este para a devida averbação.

§ 8º O credor fiduciário somente será obrigado por encargos tributários ou administrativos vinculados ao bem a partir da aquisição da posse plena, o que se dará com a apreensão do bem ou com a sua entrega voluntária.

§ 9º No prazo de 5 (cinco) dias úteis após a apreensão do bem, o devedor fiduciante terá o direito de pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário no seu requerimento, hipótese na qual será cancelada a consolidação da propriedade e restituída a posse plena do bem.”

§ 10. No valor da dívida, o credor poderá incluir os valores com emolumentos e despesas com as providências do procedimento previsto neste artigo e no art. 8º-B deste Decreto-Lei, além dos tributos e demais encargos pactuados no contrato.

§ 11. O procedimento extrajudicial não impedirá o uso do processo judicial pelo devedor fiduciante.

Assim, na hipótese de o bem não ter sido entregue ou disponibilizado voluntariamente dentro do prazo legal, o credor tem o direito de solicitar ao oficial de registro de títulos e documentos a busca e apreensão extrajudicial.

Ao receber o pedido, o oficial do cartório procederá, no caso de veículos, ao lançamento de restrição de circulação e transferência do bem no sistema mencionado no § 9º do art. 3º deste Decreto-Lei. Adicionalmente, registrará a busca e apreensão extrajudicial na plataforma eletrônica mantida pelos cartórios de registro de títulos e documentos, conforme estabelecido no art. 37 da Lei nº 11.977, de 07 de julho de 2009.

Caso necessário, o oficial comunicará aos órgãos registrais competentes para efetuar a averbação da indisponibilidade do bem e da busca e apreensão extrajudicial.

Uma vez que o bem é apreendido pelo oficial da serventia extrajudicial, o credor está autorizado a realizar a venda, sendo obrigatório comunicar essa transação ao oficial do cartório de registro de títulos e documentos, que tomará as providências subseqüentes.

Importante destacar que O procedimento extrajudicial não impedirá o uso do processo judicial pelo devedor fiduciante, portanto fica resguardado a garantia constitucional devido processo legal.

4. CONCLUSÃO


Por todo o exposto, verifica-se que facultar ao credor fiduciário que o procedimento de retomada do bem móvel seja efetivada de forma extrajudicial pelo cartório de títulos e documentos, o que confere maior celeridade ao procedimento e aumenta a possibilidades de sucesso na recuperação do crédito e satisfação dos direitos dos credores.


Destaca-se que o fenômeno da desjudicialização de demandas, que até pouco tempo eram exclusivas do judiciário, como os casos de

inventários, divórcios e usucapião, já vêm sendo executadas pelos tabelionatos de notas em todo o país, com grande aderência das partes interessadas.

A Lei 14.711, de 2023, nasce com o objetivo de desburocratizar e dar mais efetividade na execução das garantias, como no caso da Alienação Fiduciária que o bem objeto do contrato, na hipótese de inadimplência deve ser retomado pelo credor permitindo a sua alienação e liquidação do contrato.

Bibliografia:

1. Conteúdo do Portal Senado – Agência Senado, disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/12/14/derrubados-vetos-ao-marco-legal-das-garantias-de-emprestimos

2. Mensagem nº 560, de 30 de Outubro de 2023, referente a comunicação do veto parcial da Presidência da Republica, disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/Msg/Vep/VEP-560-23.htm

3. Código Civil, disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm

4. Decreto Lei nº 911, de 1º de outubro de 1969, disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/del0911.htm