1. Introdução | 2. Aspectos Legais | 3. Estação de Recarga Veicular em Condomínios | 4. Convenção de Condomínio | 5. Conclusão
1. Introdução
Conforme as estatísticas, o número de carros elétricos tem aumentado consideravelmente. Segundo o estudo denominado “O futuro da mobilidade no Brasil: uma rota para eletrificação”, realizado pela empresa de consultoria McKinsey & Company, a previsão é que o Brasil tenha 11 milhões de automóveis movidos à bateria elétrica em 2040, que corresponderão a 55% das vendas de novos veículos.
Isso faz com que as cidades precisem se ajustar a essa nova realidade.
De igual modo, os condomínios terão que se adaptar para recepcionar veículos dessa natureza, que demandam pontos de recarga elétrica.
Pensando nisso, elaboramos este artigo com a intenção de trazer alguns esclarecimentos iniciais acerca do tema, visando à orientação da comunidade condominial.
2. Aspectos Legais
A base legal e regulatória ainda está sendo construída.
Na esfera federal, identificamos o Projeto de Lei nº 710/2023 cuja finalidade é tornar obrigatória a instalação de pontos de recarga em estacionamentos coletivos e nas vias públicas, e, nos estacionamentos privados, prevê que as estações de recarga deverão corresponder a 5% das vagas, enquanto nos públicos, corresponderão a 2%. Referido projeto de lei ainda está em tramitação na Câmara dos Deputados.
Por seu turno, municípios e estados já começaram a promulgar leis locais tratando da matéria. Exemplo disso é a iniciativa pioneira do município de São Paulo que promulgou a Lei nº 17.336/2020, em vigor desde 31.03.2021, determinando que os novos empreendimentos tenham estações de recarga.
Referida lei municipal paulista dispõe sobre a obrigatoriedade da previsão de solução para carregamento de veículos elétricos em
condomínios residenciais e comerciais, para projetos de edificações novas, protocolados a partir da data de vigência da lei. De acordo com a referida norma legal, a solução adotada deve prever: (i) modo de recarga de veículo elétrico conforme as normas técnicas brasileiras; (ii) medição individualizada e cobrança da energia consumida, conforme procedimentos vigentes das concessionárias. Essa lei é válida apenas para a cidade de São Paulo.
Como a base legal é insipiente e, na prática, os consumidores já estão adquirindo os veículos elétricos, é importante que os condomínios estejam atentos a essa temática, se antecipem e busquem se preparar para o caso de moradores questionarem o síndico acerca de infraestrutura no edifício para recarga de veículos eletrificados, inclusive criando regras internas para regular a situação, evitando conflitos.
3. Estação de Recarga Veicular em Condomínios
Um dos questionamentos que surge frequentemente, diz respeito à implementação de estações de recarga em condomínios que ainda não as possuem: como proceder e quem será responsável pelos custos?
No mercado, identificam-se basicamente duas formas de instalação de estações de recarga. A primeira consiste na opção de instalar uma estação individualizada, localizada na vaga de garagem do usuário interessado, sendo o próprio usuário responsável pela instalação. Este sistema normalmente inclui um medidor que registra o consumo, cujos custos são suportados pelo morador da unidade.
A segunda forma ocorre quando o condomínio decide implementar um sistema coletivo de recarga, provendo tomadas a serem utilizadas de forma comum pelos condôminos, com os custos individuais sendo repassados mensalmente através das cotas condominiais.
Para a implementação deste projeto, é necessária uma assembleia condominial onde o tema será discutido e os condôminos decidirão se aprovam ou não a instalação, qual será o modelo, quantos pontos serão instalados, quais serão os horários de uso.
Esse entendimento se fundamenta no princípio da soberania da decisão assemblear, que impede a alteração das regras ao critério individual de cada condômino. Dado que a instalação da infraestrutura afeta áreas comuns do edifício (Ex: demandam perfuração de parede e coluna do prédio;
instalação de cabos, relógio medidor e fiação nas lajes e paredes; utilização de dutos, rede e disjuntor/transformador central de eletricidade etc.), surge a necessidade de que referida benfeitoria/obra seja submetida ao crivo da assembleia de condôminos. Em reforço, tem-se que a utilização de garagem com ponto de abastecimento, implica em modificação de sua destinação e utilização, o que não se admite, importando, igualmente em agravamento dos riscos junto à seguradora. A respeito de alterações dessa natureza, verifique-se o que dispõe o art. 1.342 do Código Civil:
“Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.”
Nessa linha de raciocínio, segue trecho de sentença proferida em 18.07.2022, pela 1ª Vara Cível do Foro Regional III – Jabaquara, da Comarca de São Paulo, no processo nº 1011178-51.2022.8.26.0003:
“Destarte, ainda que as vagas de garagem se tratem de propriedade exclusiva e autônoma de cada condômino, a rede elétrica da garagem até a unidade privativa não é, de modo que não cabe ao condômino individualmente efetuar alteração sem deliberação e autorização da assembleia de condôminos, tal como dispõe o art. 1.342 do Código Civil”.
e, mais adiante, segue a mesma decisão:
“Assim, tendo havido deliberação negativa por parte da assembleia acerca da pretensão do autor, que, repita-se envolve modificação de área comum, esta deve prevalecer, obrigando todos os condôminos, ressaltando-se que a deliberação não infringiu a lei, a convenção de condomínio e não violou o direito subjetivo do condômino autor, mas sim assegurou o interesse da coletividade condominial.”
De outra parte, para garantir a segurança durante o processo, é altamente recomendável contratar uma empresa especializada na área, com a atuação de um engenheiro eletricista devidamente habilitado e registrado. Este profissional realizará uma análise técnica detalhada e emitirá um laudo
para verificar se a infraestrutura do condomínio suporta a instalação das estações de recarga, sem comprometer o fornecimento de energia ou causar sobrecargas na estrutura elétrica, o que poderia acarretar diversos riscos.
Orienta-se, portanto, que síndicos e administradoras, ao serem questionados sobre este tema, contratem verificações técnicas especializadas para avaliar a compatibilidade do edifício com a instalação de estações de recarga para veículos eletrificados. Caso a viabilidade técnica seja confirmada, é preciso incluir o assunto na pauta de uma assembleia condominial para que os condôminos possam deliberar e decidir a respeito. Conforme estipulado pelo art. 1.342 do Código Civil, a aprovação em assembleia requer o quórum de dois terços de todos os condôminos.
4. Convenção de Condomínio
É importante verificar se a convenção de condomínio e as normas internas trazem alguma proibição ou restrição em relação a esse tipo de instalação.
Caso se considere necessário, é interessante propor uma alteração na convenção de condomínio ou mesmo no regimento interno, para permitir a instalação de tomadas para veículos eletrificados.
5. Conclusão
Tendo em vista o aumento dos carros elétricos e a necessidade de adaptação dos condomínios, é importante que os síndicos estejam atentos às questões legais e técnicas das estações de recarga.
A decisão sobre a implementação deve ser tomada em assembleia, respeitando o princípio da decisão coletiva.
Uma análise técnica prévia, por um engenheiro eletricista, é fundamental para garantir a segurança e conformidade com a infraestrutura elétrica.
Finalmente, ajustes na convenção ou regimento interno podem ser considerados para facilitar a integração dos veículos elétricos no ambiente condominial, prevenindo conflitos futuros entre condôminos.
Bibliografia:
- A instalação de tomadas para carros elétricos em condomínios e suas implicações. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/polyfills-ie.min.js Acesso em 21.06.2024;
- Carro elétrico no condomínio: o que é preciso saber? Disponível em: https://www.ucondo.com.br/blog/carro-eletrico-e-os-condominios-tudo-que-voce-precisa-saber Acesso em: 21.06.2024;
- Há obrigação do condomínio em instalar tomadas para carros elétricos? Disponível em: https://www.zmr.adv.br/2024/01/24/ha-obrigacao-do-condominio-em-instalar-tomadas-para-carros-eletricos/ Acesso em 21.06.2024; - Lei nº 17.336/2020. Disponível em: LEI Nº 17.336 DE 30 DE MARÇO DE 2020 « Catálogo de Legislação Municipal (prefeitura.sp.gov.br). Acesso em 29.06.2024;
- MCKINSEY & COMPANY. O futuro da mobilidade no Brasil: uma rota para eletrificação. 27 jan. 2023. Disponível em: https://www.mckinsey.com/br/our-insights/all-insights/o-futuro-da-mobilidade-no-brasil. Acesso em: 29.06.2024;
- Projeto de Lei nº 710/2023. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2238159&filename=PL%20710/2023 Acesso em 29.06.2024.