ARTIGO PSJ

O Tempo como Aliado ou Adversário: a Prescrição de Cobranças Extrajudiciais e a Necessidade de Vigilância Ativa

Portela Soluções Jurídicas

Escritório de Advocacia

1. Introdução | 2. Conceito de Prescrição | 3. Prazos Prescricionais Aplicáveis e os Requisitos para a sua Interrupção | 4. O Reconhecimento da Prescrição | 5. Vigilância Ativa | 6. Conclusão

1. Introdução

A prescrição de cobranças extrajudiciais refere-se ao fenômeno pelo qual o direito de uma pessoa cobrar judicialmente uma dívida, ou buscar reparação por uma violação, é extinto após um determinado período de tempo estabelecido em lei. Em outras palavras, se o titular de um direito não exercer sua pretensão dentro do prazo prescricional aplicável, ele perde o direito de buscar a cobrança ou reparação judicialmente.

A importância da prescrição no Direito é fundamental para garantir a estabilidade das relações jurídicas e a segurança das transações comerciais. Ela promove a certeza e a previsibilidade nas relações entre as partes, evitando que pendências antigas possam ser ressuscitadas indefinidamente. Além disso, a prescrição incentiva a diligência das partes na proteção de seus direitos, estimulando a busca por soluções de conflitos de forma rápida e eficiente.

No contexto das cobranças extrajudiciais, a prescrição desempenha um papel crucial ao estabelecer prazos dentro dos quais credores podem tomar medidas para recuperar créditos antes que o direito de cobrança seja perdido. Portanto, compreender os prazos prescricionais aplicáveis e a importância da vigilância ativa na prevenção da prescrição, é essencial para as partes envolvidas em transações comerciais e disputas contratuais.

2. Conceito de Prescrição

A prescrição, segundo prevê o artigo 189 do Código Civil, é a extinção da pretensão de ingressar com uma ação judicial para assegurar um direito, em virtude do tempo.

A lei estabelece prazos prescricionais dentro dos quais o titular do direito deve exercer sua pretensão judicial para cobrar uma dívida, buscar reparação por um dano ou exigir o cumprimento de uma obrigação. Quando esse prazo prescricional é ultrapassado sem que a pretensão seja exercida, o seu direito é considerado extinto, e a parte prejudicada perde a possibilidade de buscar judicialmente sua satisfação.

Enquanto a prescrição diz respeito ao direito de ação, ou seja, ao direito de demandar judicialmente uma pretensão, a decadência refere-se à perda do próprio direito material, caso seu titular não o exerça dentro de determinado prazo.

Em resumo, enquanto a prescrição afeta o direito de ação, a decadência afeta o próprio direito em si, sendo ambas essenciais para a segurança das relações jurídicas, pois garantem que as partes ajam com diligência na proteção de seus direitos e contribuem para a estabilidade e a previsibilidade do sistema jurídico como um todo.

3. Prazos Prescricionais Aplicáveis e os Requisitos para a sua Interrupção.

Os prazos prescricionais encontram-se estabelecidos nos artigos 205 e 206 do Código Civil e determinam o período de tempo dentro do qual uma determinada pretensão deve ser exercida, sob pena de extinção do direito.

A legislação institui que os prazos prescricionais poderão ser de 01 (um) a 05 (cinco) anos, e, quando a lei não fixar outro prazo, este será de 10 (dez) anos.

As causas de interrupção da prescrição estão descritas no artigo 202 do Código Civil, sendo certo que a prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.

A interrupção da prescrição somente poderá ocorrer uma vez.

Registre-se que, segundo dispõe o artigo 197 do Código Civil, o prazo prescricional não corre entre cônjuges, entre ascendentes e descendentes, entre tutelados e seus tutores e nem entre curatelados e seus curadores. De igual modo, os artigos 198, 199 e 200, do mesmo Código Civil, também descrevem situações em que não corre a prescrição.

4. O Reconhecimento da Prescrição

O reconhecimento da prescrição, tanto pelo devedor quanto pelo credor, pode ter diversas implicações importantes e estratégicas nas relações jurídicas e nos litígios.

Quando o devedor invoca a prescrição, ele está sustentando que o direito de cobrança do credor foi extinto devido ao transcurso do tempo. Isso pode ser vantajoso para o devedor, pois ele não será mais obrigado a satisfazer a dívida, evitando despesas adicionais com litígios ou cobranças judiciais.

Já quando é o credor que reconhece a prescrição, ele abre mão do direito de buscar judicialmente a cobrança da dívida. Isso significa que o credor não poderá mais recorrer aos tribunais para exigir o cumprimento da obrigação.

Verifica-se da previsão contida no artigo 882 do Código Civil que: “Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.”

Ou seja, caso o devedor pague uma dívida prescrita, não poderá pedir a devolução da quantia já paga, pois o direito ao crédito permanece inalterado, embora a pretensão de exigir o crédito judicialmente esteja extinta.

A doutrina corrobora a lei. Para Silvio de Salvo Venosa: “a prescrição extingue a ação, mas não o direito. Mesmo prescrita, a obrigação existe. Mesmo prescrita a dívida, de qualquer modo, persiste a obrigação moral do devedor”.

Assim, de acordo com o artigo 882 do multicitado Código Civil, mesmo com o reconhecimento da prescrição do crédito, este em si não é afetado, podendo ser cobrado extrajudicialmente, permitindo-se que o devedor efetue o pagamento espontaneamente.

Em recente decisão, no julgamento do XXXXX, cujo acórdão foi publicado em xx.xx.xxxx, o STJ fixou o entendimento que a prescrição impede tanto a cobrança judicial quanto a extrajudicial.

Para a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, quando o credor busca o recebimento dos valores pela cobrança extrajudicial, ele ainda está exercendo sua pretensão. Desse modo, para a ministra, quando ocorre a prescrição, finda a pretensão do credor, que não poderá mais ter a pretensão de receber, seja judicialmente ou extrajudicialmente.

Assim disse a Ministra:

“Se a pretensão é o poder de exigir o cumprimento da prestação, uma vez paralisada em razão da prescrição, não será mais possível exigir o referido comportamento do devedor. Ou seja, não será mais possível cobrar a dívida.”

Portanto, para o STJ, após a prescrição o credor não pode efetuar qualquer cobrança extrajudicial da dívida, seja por meio de telefonemas, e-mail, mensagens de texto de celular (SMS e WhatsApp).

5. Vigilância Ativa

Vigilância ativa nas cobranças extrajudiciais se refere à prática proativa de monitorar de perto os prazos prescricionais aplicáveis a dívidas e obrigações pendentes, fora do âmbito judicial.

O advogado especialista tem a responsabilidade de garantir que os interesses de seus clientes sejam protegidos e que eles não percam oportunidades de cobrar dívidas ou buscar reparação por violações de direitos devido à prescrição.

Isso envolve uma série de ações, incluindo:

a) Conhecimento dos Prazos Prescricionais: É fundamental que os advogados estejam familiarizados com os prazos prescricionais relevantes, estabelecidos pela legislação, aplicáveis a cada tipo de dívida ou obrigação. Isso permite que as situações sejam identificadas rapidamente para que prescrição não se torne uma preocupação.

b) Monitoramento Constante: O especialista deve monitorar continuamente o status das dívidas e obrigações de seus clientes para garantir que nenhum prazo prescricional seja perdido inadvertidamente. Isso pode envolver o uso de sistemas de gerenciamento de prazos, lembretes e calendários para acompanhar os prazos importantes.

c) Comunicação Efetiva com os Clientes: A comunicação aberta e eficaz deve ser mantida junto aos clientes para garantir que todas as informações relevantes sobre dívidas e obrigações sejam compartilhadas prontamente. Isso inclui informar aos clientes sobre os prazos prescricionais aplicáveis e orientá-los sobre as medidas que precisam ser tomadas para evitar a prescrição.

d) Tomadas de Medidas oportunas: Se um prazo prescricional estiver se aproximando, o advogado especialista deve agir prontamente para proteger os interesses de seus clientes. Isso pode envolver o envio de notificações formais de cobrança, negociações com devedores e, se necessário, o início de procedimentos judiciais para interromper a prescrição.

e) Atualização sobre Alterações Legislativas: É de suma importância que o advogado especialista se mantenha atualizado sobre quaisquer alterações na legislação que possam afetar os prazos prescricionais ou os procedimentos de cobrança extrajudicial. Isso garante que eles possam fornecer aconselhamento jurídico preciso e eficaz aos seus clientes.

Em suma, a vigilância ativa nas cobranças extrajudiciais envolve um compromisso constante de estar ciente dos prazos prescricionais, monitorar de perto o status das dívidas e obrigações dos clientes e tomar medidas oportunas para proteger seus interesses legais. Essa abordagem proativa é essencial para garantir que os clientes não percam oportunidades importantes de cobrar dívidas ou buscar reparação devido à prescrição.

5. Conclusão

A prescrição de cobranças extrajudiciais é uma realidade que permeia o universo jurídico, moldando a dinâmica das relações comerciais e contratuais. Em sua essência, a prescrição representa uma dicotomia intrigante: pode ser tanto aliada quanto adversária, dependendo do prisma pelo qual é observada. Nesse contexto, a vigilância ativa emerge como um pilar fundamental para gerenciar essa dualidade e assegurar os interesses das partes envolvidas.

Por um lado, o tempo se revela como um aliado ao estabelecer prazos definidos para o exercício de direitos e a cobrança de dívidas. Esses prazos conferem estabilidade às relações jurídicas, promovendo a segurança e previsibilidade necessárias para o funcionamento harmonioso do mercado. Ao definir um limite temporal para a exigibilidade das obrigações, o tempo incentiva a diligência e a responsabilidade nas transações comerciais, estimulando o cumprimento pontual das obrigações.

Por outro lado, o tempo pode se transformar em um adversário quando a prescrição ameaça extinguir direitos de cobrança ou reparação. Com a recente decisão do STJ, na qual a prescrição impede a cobrança não só judicial, como a extrajudicial, a inércia ou negligência na gestão das obrigações pode levar à perda irreversível de direitos, causando prejuízos financeiros e desequilíbrios nas relações contratuais.

É nesse cenário que a vigilância ativa se revela como uma necessidade premente. O advogado especialista, como guardião dos interesses de seus clientes, desempenha um papel crucial na prevenção da prescrição de cobranças extrajudiciais. Através da constante monitorização dos prazos prescricionais, da comunicação eficaz com os clientes e da tomada de medidas oportunas, os advogados podem mitigar os riscos associados à prescrição e proteger os direitos de seus constituintes.

Além disso, a vigilância ativa não se restringe apenas aos advogados, mas também se estende às próprias partes envolvidas nas relações jurídicas. Empresas, indivíduos e instituições têm o dever de manter um

acompanhamento diligente de suas obrigações e prazos prescricionais, evitando assim a perda injusta de direitos.

Em síntese, o tempo pode ser tanto aliado quanto adversário no contexto da prescrição de cobranças extrajudiciais. A vigilância ativa emerge como uma ferramenta essencial para gerenciar essa dualidade, garantindo que o tempo seja utilizado de forma apropriada e benéfica para todas as partes envolvidas. Somente através de uma abordagem vigilante e proativa é possível assegurar a proteção dos direitos e a preservação da justiça nas relações jurídicas.


Bibliografia:

- Belmonte, Renata Martins. Cobrança Judicial e Prescrição de Dívida: o que impacta na rotina das empresas? Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-nov-21/a-cobranca-extrajudicial-e-a-prescricao-da-divida-o-que-isso-impacta-na-rotina-das-empresas/#:~:text=Os%20prazos%20prescricionais%20variam%20de,julga%20ter%20de%20alguma%20coisa. Publicação de 21.11.2023. Acesso em: 22.02.2024.

- Dizer Direito. O reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a extrajudicial do débito; assim, se uma dívida está prescrita o credor não pode ficar ligando ou mandando mensagens para cobrar o devedor. Disponível em: https://www.dizerodireito.com.br/2023/12/o-reconhecimento-da-prescricao-da.html#:~:text=dezembro%20de%202023-,O%20reconhecimento%20da%20prescri%C3%A7%C3%A3o%20da%20pretens%C3%A3o%20impede%20tanto%20a%20cobran%C3%A7a,mensagens%20para%20cobrar%20o%20devedor. Publicação de 16/12/2023. Acesso em: 22.02.2024.

- Martinelli, Ana Paula Franchini Miguel. A possibilidade de cobrança extrajudicial de dívida prescrita e a impossibilidade de o Judiciário decidir contra o princípio da “supremacia do Poder Legislativo” Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/338045/a-possibilidade-de-cobranca-extrajudicial-de-divida-prescrita-e-a-impossibilidade-de-o-judiciario-decidir-contra-o-principio-da--supremacia-do-poder-legislativo . Publicação de 18.12.2020. Acesso em 22.02.2024.

- STJ Notícias. Reconhecimento da Prescrição impede a cobrança judicial e extrajudicial da dívida. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/22112023-Reconhecimento-da-prescricao-impede-cobranca-judicial-e-extrajudicial-da-divida.aspx. Publicação de 22.11.2023. Acesso em: 22.02.2024.

-Lei nº 10.406/2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 22.02.2024.

- Resumo do Informativo 792 do STJ. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/resumo-do-informativo-792-do-stj/2016829383. Acesso em 22.02.2024.

- Tartuce, Flavio. Manual de Direito Civil. São Paulo: Editora Forense, 2018. p.298.