ARTIGO PSJ
Provimento CNJ nº 172/2024: Consolidação e Restrições na Formalização de Contratos de Alienação Fiduciária
1. Introdução | 2. Contexto Histórico e Alienação Fiduciária de Imóveis | 3. Principais Pontos do Provimento CNJ nº 172/2024 | 3.1. Restrição às Entidades Integrantes do SFI |3.2. Padronização Nacional | 3.3. Aprimoramento dos Procedimentos Notariais e Custos Operacionais | 4. Prática Anterior e Modificações Introduzidas | 5. Implicações no Mercado Imobiliário | 5.1. Aspectos Positivos | 5.2. Aspectos Negativos | 6. Conclusão
1. Introdução
O Provimento CNJ nº 172/2024, promulgado em 05 de junho de 2024 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), estabelece diretrizes essenciais para a formalização de contratos de alienação fiduciária de bens imóveis no Brasil. Esta regulamentação visa a consolidar e padronizar o entendimento jurídico nacional sobre o tema, assegurando maior segurança e uniformidade.
Conforme o provimento, a formalização de contratos de alienação fiduciária por instrumento particular, regidos pela Lei nº 9.514/1997, com efeito de escritura pública, é restrita às entidades autorizadas a operar no âmbito do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), . Em contrapartida, a formalização por instrumento público pode ser realizada por pessoa física e demais entidades não vinculadas ao SFI.
Este artigo analisa os principais pontos do provimento, seu contexto histórico e as implicações no mercado imobiliário, bem como a transição das práticas anteriores para as introduzidas pela nova norma.
2. Contexto Histórico e Alienação Fiduciária de Imóveis
A Lei nº 9.514, promulgada em 20 de novembro de 1997, instituiu o SFI e estabeleceu a alienação fiduciária de imóveis como uma garantia destinada a proporcionar maior segurança e eficiência na recuperação de crédito.
A alienação fiduciária permite ao credor a propriedade resolúvel do imóvel até a quitação da dívida pelo devedor, facilitando a execução em caso de inadimplemento.
Antes da entrada em vigor do Provimento CNJ nº 172/2024, prevalecia uma interpretação flexível da lei, permitindo que a formalização da alienação fiduciária ocorresse tanto por escritura pública, quanto por instrumento particular com eficácia de escritura pública. Essa flexibilidade era amplamente utilizada pelo mercado de crédito, visando à agilidade nos processos e à redução de custos operacionais. No entanto, essa prática gerava controvérsias quanto à abrangência e à legitimidade desses contratos.
O novo provimento limita a utilização do instrumento particular às entidades autorizadas pelo SFI, impondo uma regra uniforme a todos os Cartórios de Registro de Imóveis no Brasil.
3. Principais Pontos do Provimento CNJ nº 172/2024
3.1. Restrição às Entidades Integrantes do SFI
O Provimento alterou o Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra), instituído pelo Provimento nº 149, de 30 de agosto de 2023, para dispor sobre a forma para contratação da garantia de alienação fiduciária de bens imóveis. Vejamos:
Art. 1º O Título Único do Livro III da Parte Especial do Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra), instituído pelo Provimento nº 149, de 30 de agosto de 2023, passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo VII:
(...)
Art. 440-AO. A permissão de que trata o art. 38 da 9.514/1997 para a formalização, por instrumento particular, com efeitos de escritura pública, de alienação fiduciária em garantia sobre imóveis e de atos conexos, é restrita a entidades autorizadas a operar no âmbito do Sistema de Financiamento Imobiliário - SFI (art. 2º da Lei n. 9.514/1997), incluindo as cooperativas de crédito.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não exclui outras exceções legais à exigência de escritura pública previstas no art. 108 do Código Civil, como os atos envolvendo: I - administradoras de Consórcio de Imóveis (art. 45 da Lei n. 11.795, de 8 de outubro de 2008); II - entidades integrantes do Sistema Financeira de Habitação (art. 61, § 5º, da Lei n. 4.380, de 21 de agosto de 1964.”
Este esclarecimento alinha-se aos artigos 22, § 1º e 23, § 2º e § 3º da Lei nº 9.514/1997, garantindo que apenas entidades autorizadas possam realizar contratos de alienação fiduciária por instrumento particular com efeitos de escritura pública.
Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o fiduciante, com o escopo de garantia de obrigação própria ou de terceiros, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.
§ 1º A transferência da propriedade fiduciária será feita mediante instrumento público ou particular, registrado no competente Registro de Imóveis.
(...)
Art. 23. O contrato que serve de base para a alienação fiduciária de bem imóvel deverá ser celebrado por instrumento público ou particular, e, neste último caso, o instrumento particular poderá ter efeitos de escritura pública, desde que cumpridas as exigências legais.
(...)
§ 2º O contrato, quando celebrado por instrumento particular, deverá ser registrado no competente Registro de Imóveis para que produza efeitos em relação a terceiros.
§ 3º Para os fins desta lei, equiparam-se aos instrumentos públicos, quanto aos seus efeitos, os contratos celebrados por entidades autorizadas a operar no Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), desde que observados os requisitos de validade dos negócios jurídicos.
3.2. Padronização Nacional
A uniformização dos procedimentos trazida pelo Provimento visa a mitigar a insegurança jurídica que existia devido à interpretação variável da lei pelos diferentes cartórios de registro de imóveis.
Agora, com a obrigatoriedade de seguir um padrão único, todos os registros de alienação fiduciária devem ser realizados de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo CNJ.
3.3. Aprimoramento dos Procedimentos Notariais e Custos Operacionais
O Provimento também estabeleceu novas diretrizes para os procedimentos notariais, exigindo maior rigor na verificação da autorização das entidades para operar no SFI e garantindo que todos os contratos sigam as normas de formalização adequadas. No entanto, a exigência de escritura pública, em detrimento do instrumento particular, tende a elevar os custos operacionais das transações imobiliárias.
Escrituras públicas são geralmente mais onerosas e burocráticas, o que pode encarecer o processo de obtenção de crédito para os consumidores e tornar menos competitivas as instituições financeiras que não fazem parte do SFI. Assim, o novo regulamento favorece instituições já adaptadas ao SFI, reduzindo potencialmente a competitividade no mercado.
4. Prática Anterior e Modificações Introduzidas
Antes do Provimento CNJ nº 172/2024, a prática de formalização de contratos de alienação fiduciária por instrumento particular era utilizada por uma ampla gama de agentes, o que frequentemente resultava em problemas de validade e eficácia dos contratos. A ausência de uma padronização clara permitia que entidades não autorizadas pelo SFI também realizassem tais contratos, levando a inseguranças jurídicas e disputas judiciais.
Com a entrada em vigor do provimento, o artigo 22 da Lei nº 9.514/1997 passou a ser interpretado de forma restritiva, limitando essa formalização exclusivamente às entidades autorizadas. Essa mudança assegura que apenas instituições financeiras e outras entidades regulamentadas pelo SFI possam formalizar contratos de alienação fiduciária por instrumento particular, garantindo maior segurança jurídica e transparência.
5. Implicações no Mercado Imobiliário
5.1. Aspectos Positivos
A decisão do CNJ representa um esforço para consolidar um ambiente jurídico mais uniforme e seguro para as transações imobiliárias no Brasil. A principal consequência é o aumento da segurança jurídica, o que pode fomentar a confiança dos investidores e reduzir o número de litígios. Além disso, a padronização dos procedimentos notariais tende a agilizar os processos de formalização dos contratos e a aumentar a eficiência na execução das garantias fiduciárias.
5.2. Aspectos Negativos
· Aumento dos Custos Operacionais: a exigência de escritura pública em vez de instrumento particular eleva os custos e a burocracia, dificultando o acesso ao crédito, especialmente para consumidores de menor renda.
· Redução da Flexibilidade: a restrição limita a flexibilidade anterior, exigindo um processo mais caro e burocrático, afetando a agilidade e os custos das transações.
· Potencial de Exclusão: a limitação pode excluir agentes menores ou regionais, restringindo o acesso ao crédito em áreas menos desenvolvidas e aumentando desigualdades regionais.
6. Conclusão
O Provimento CNJ nº 172/2024 trouxe mudanças significativas na formalização de contratos de alienação fiduciária de bens imóveis no Brasil. Ao restringir a formalização por instrumento particular exclusivamente às entidades autorizadas a operar no SFI, o provimento visa a promover maior segurança jurídica, padronização de procedimentos e redução de litígios no mercado imobiliário.
Embora essa restrição possa aumentar os custos operacionais e reduzir a flexibilidade de alguns agentes, os benefícios em termos de previsibilidade e confiança no mercado superam as possíveis desvantagens.
O fortalecimento das normas e a centralização do processo em entidades regulamentadas pelo SFI refletem um compromisso com a transparência e a segurança nas transações imobiliárias, consolidando um ambiente mais robusto e confiável para investidores e consumidores.
Bibliografia:
· Brasil. Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9514.htm. Acesso em: 18 jun. 2024.
· Conselho Nacional de Justiça. Decisão de 5 de junho de 2024 sobre a uniformização dos procedimentos de alienação fiduciária. Disponível em: http://www.cnj.jus.br. Acesso em: 18 jun. 2024.
· ABELHA, Andre. EXTRA: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E INSTRUMENTO PARTICULAR. Disponível em: (21) Publicação | Feed | LinkedIn. Acesso em: 11 jun. 2024.
· CÓDIGO NACIONAL DE NORMAS DO FORO EXTRAJUDICIAL DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Disponível em:codigo-nacional-de-normas-da-corregedoria-nacional-de-justica-v6-23-08-2023.pdf (cnj.jus.br). Acesso em 18 jun. 2024.