ARTIGO PSJ

Rescisão do Contrato de Financiamento por Impossibilidade de Habitação

Portela Soluções Jurídicas

Escritório de Advocacia

Imagine que você adquiriu um imóvel usado, em um edifício antigo. O apartamento atende as suas necessidades, possui um preço atrativo e parece uma excelente opção de compra. Você obtém a documentação necessária, solicita a contratação de financiamento imobiliário, e, após a vistoria do imóvel, seu financiamento é aprovado, através de um dos programas de financiamento habitacional do Governo Federal.

Porém, muito antes de quitar o imóvel, são identificados problemas decorrentes da falta de manutenção que comprometem a estrutura do prédio e impossibilitam que este seja habitado. Os moradores são notificados pelo condomínio a desocupar seus imóveis, até que o problema seja resolvido.

Os moradores acionam a seguradora responsável, informando a ocorrência do sinistro, para que o problema seja resolvido. Porém, esta se recusa a solucionar os problemas prontamente, enquanto você é obrigado a deixar sua residência e continuar pagando o financiamento imobiliário.

Neste caso, é possível rescindir o contrato de financiamento bancário, reavendo os valores pagos, até então. Isto porque, boa parte dos Tribunais do país entende que, a existência de vício redibitório autoriza a rescisão do contrato de alienação fiduciária, uma vez que este não poderá subsistir ante a ausência de garantia.

Além disso, não se pode ignorar a responsabilidade da Caixa Econômica Federal, tendo em vista que se trata de imóvel financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação.

Para facilitar o entendimento, deve-se salientar que vícios redibitórios são, nas palavras de Maria Helena Diniz:

“defeitos ocultos existentes na coisa alienada, objeto de contrato comutativo ou de doação onerosa ou com encargo, não comum às congêneres que a tornam imprópria ao uso a que se destina ou lhe diminuem sensivelmente o valor, de tal modo que o negócio não se realizaria se esses defeitos fossem conhecidos, dando ao adquirente ação para redibir o contrato ou para obter abatimento no preço.”

Em outras palavras, caso o adquirente tivesse conhecimento acerca da possibilidade de interdição do edifício, jamais adquiriria uma de suas unidades habitacionais. Por isso, está legalmente autorizado a rescindir o contrato, sem sofrer as penalidades contratuais.

Tal entendimento encontra respaldo no art. 441 do Código Civil. Vejamos:

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Assim, entende-se que, para a rescisão contratual, será necessário o preenchimento de três requisitos, quais sejam, (i) um contrato comutativo, no caso; (ii) a demonstração de vícios desconhecidos pelo adquirente, na data da tradição/registro; (iii) que esses vícios ensejem a redução do valor da coisa ou inadequação para o fim a que se destina.

Nestes casos, entende-se que não há lógica em exigir a continuidade do pagamento de um imóvel viciado, quando a lei garante a possibilidade de rescisão. Com esta, as partes retornem ao “status quo ante”, devendo a instituição financeira restituir as parcelas pagas, devidamente corrigidas, através de Ação Redibitória.

Cabe lembrar que, no caso de imóveis financiados por programas habitacionais do Governo Federal, esta situação ganha contornos ainda mais específicos. Isto porque, nestas situações, a Caixa econômica Federal figura como agente promotor de políticas públicas para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda.

Assim, a vistoria prévia realizada pela CEF, não poderá se atentar apenas à possibilidade de o imóvel garantir o financiamento contratado. Mas às condições de habitabilidade e garantia de moradia do adquirente, podendo ser responsabilizada caso identificados vícios que as comprometam.

Por fim, importa frisar que o prazo para a propositura da ação redibitória será de um ano, contado a partir da constatação do vício. O referido prazo se encontra disposto no parágrafo primeiro do art. 445 do Código Civil. Observe-se:

Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.

§ 1º. Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando de bens móveis; e de um ano, para os imóveis.

Sopese-se, ademais, que o prazo supramencionado é decadencial, ou seja, após o transcurso do prazo, opera-se a perda do direito que não fora requerido a tempo.