ARTIGO PSJ
STJ Fixa Matrícula Individualizada para Memorial de Registro de Propriedade Rural
1. Introdução | 2. Alteração Legislativa | 3. Entendimento do STJ | 4. Conclusão
1. Introdução:
Entendimento da 4ª Turma do STJ determinou que, para fins de registro imobiliário rural, a certificação do memorial descritivo de propriedade deve considerar as matrículas individuais de cada imóvel que o compõe. A discussão do presente tema perpassa pela diferenciação dos conceitos de imóvel rural para o direito registral e para a legislação agrária.
Conforme legislação agrária, extraída da interpretação do art. 4º da Lei nº 4.504/64, Estatuto da Terra, bem como do art. 4º da Lei da Reforma Agrária (Lei nº 8.629/93), utiliza-se para fins cadastrais no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a definição do imóvel rural como uma área formada por uma ou mais matrículas de terras contínuas, ou seja, confrontantes, podendo haver interrupções físicas, como estradas e rios, do mesmo titular, proprietário ou posseiro, seja pessoa física ou jurídica. Há previsão, ainda, que a área pode estar localizada tanto na zona rural quanto urbana do município, uma vez que o que a caracteriza é sua “destinação agrícola, pecuária, extrativista vegetal, florestal ou agroindustrial”.
Todavia, esta definição não abrange o direito registral. A Lei nº 6.015/73, em seu art. 176, § 1°, I, respeitando os princípios da especialidade e da unitariedade, determina que cada matrícula tem uma única unidade correspondente, estendendo-se aos imóveis rurais.
Tal diferenciação conceitual decorre de um claro distanciamento dos objetivos das normas reguladoras. “Para o INCRA é importante identificar se foram adotados corretamente os instrumentos técnicos para medição e georreferenciamento para que não haja superposição de áreas nos imóveis rurais. No que se refere ao Cartório de Registro de Imóveis o que se mostra relevante é se o negócio jurídico cujo título se pretende registrar teria sido celebrado com o titular da propriedade imobiliária”, conforme se denota do entendimento do STJ.
2. Alteração Legislativa:
A Lei nº 10.267/2001 instituiu na Lei de Registros Públicos a integração, em casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, do georreferenciamento nos registros dos imóveis rurais, com a necessidade de apresentação de memorial descritivo junto à matrícula do imóvel, garantindo a precisão e a veracidade da descrição desses imóveis. Assim, o art. 176, já referenciado, passou a ter a seguinte redação:
“Art. 176 [...] § 3º Nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, a identificação prevista na alínea a do item 3 do inciso II do § 1° será obtida a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais”.
Em decorrência da alteração legislativa, o sistema de georreferenciamento passou a integrar o registro de imóveis rurais, com a necessidade de que a certificação do memorial descritivo conste da matrícula do imóvel. A regulamentação buscou conferir segurança jurídica e estabilidade às relações que envolvem os direitos reais, inclusive para fins de publicidade.
3. Entendimento do STJ:
Dado o exposto, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Recurso Especial nº 1706088 - ES (2017/0277890-0), determinou para os casos de registro imobiliário rural, a necessidade de a certificação do memorial descritivo de propriedade, regulado nos §§ 3º e 4º do art. 176 da Lei de Registros Públicos, considerar as matrículas individualizadas de cada imóvel que a compõe, conforme previsto na Lei de Registro de Imóveis, e, portanto, cada matrícula deve ser demarcada e georreferenciada individualmente.
Por meio desse entendimento, o colegiado afastou o uso do conceito de imóvel rural previsto na legislação agrária, que abrange as glebas contíguas do mesmo proprietário utilizadas para objetivos econômicos similares.
4. Conclusão:
Com efeito, é possibilitado ao proprietário requerer a unificação das áreas descritas em matrículas distintas de sua propriedade, o que então resultará na formação de uma nova unidade imobiliária com a abertura de uma nova matrícula. Assim, o perímetro georreferenciado abrangerá todos os imóveis referidos nas suas respectivas matrículas, as quais serão encerradas para constituir uma nova matrícula, referente a um único imóvel rural.
Concluiu o STJ, ao fim, que “não se aplica o conceito agrário de imóvel rural ao procedimento de certificação do memorial descritivo georreferenciado, para os fins e efeitos do registro imobiliário, devendo o georreferenciamento ser realizado no âmbito de cada matrícula individualizada”.
Referências:
REsp 1706088/ES, Relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 14/05/2024, DJe de 14/05/2024. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/julgamento/eletronico/documento/mediado/?documento_tipo=integra&documento_sequencial=245885892®istro_numero=201702778900&peticao_numero=&publicacao_data=20240527&formato=PDF. Acesso em: 07/06/2024.
STJ. Memorial descritivo deve considerar matrículas individualizadas dos imóveis que integram a propriedade rural. 05 de junho de 2024. Disponínel em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/05062024-Memorial-descritivo-deve-considerar-matriculas-individualizadas-dos-imoveis-que-integram-a-propriedade-rural.aspx. Acesso em: 07/06/2024.